Quando o Pavilhão dos Desportos de Lisboa foi construído a cidade não tinha infra-estruturas de grande dimensão para a prática desportiva. O Pavilhão, mais tarde baptizado de «Carlos Lopes», foi o local dos grandes jogos de hóquei e de muitas disputas entre colectividades e clubes populares. A utilização do Pavilhão Carlos Lopes para espectáculos começa de uma forma mais sistemática nos anos 70, antes ainda do 25 de Abril . Logo a seguir ele tornou-se no ponto obrigatório de comícios e congressos partidários e no palco do culminar de campanhas eleitorais. Isto até ter ficado impossível de utilizar, que é a situação em que agora se encontra.
Devido à forma como foi concebido e aos materiais de contrução utilizados, o Pavilhão sempre teve má acústica (péssima, de facto), e em função da época em que foi feito apresenta graves problemas estruturais. Actualmente o Pavilhão, para além de estar em ruína porque desde há décadas não lhe é feita uma conservação eficaz (na realidade há risco de utilização por causa do estado em que está o tecto), não tem o mínimo de condições de comodidade, nem condições técnicas e de segurança. As bancadas não têm cadeiras, não há ventilação nem aquecimento e muito menos ar condicionado, a instalação eléctrica é insuficiente segundo os padrões actuais, os camarins/cabinas/vestiários são obsoletos, o sistema de incêndios é de anedota, o tecto técnico é inexistente. Além disso foi construído numa época em que não se pensava que uma sala destas poderia ter utilizações diversas e a sua própria estrutura dificulta qualquer recuperação séria segundo padrões contemporâneos – a começar pelo problema das colunas que destroem a visibilidade e dificultam a operação do espaço. Em suma, como está, não serve para nada.
Por outro lado a infraestrutura de equipamentos desportivos da cidade evoluíu. Com os novos estádios construíram-se novos pavilhões bem equipados e o Pavilhão Atlântico é hoje a sala de referência equivalente ao que o Carlos Lopes foi há 30 anos. Por isso acho que faz sentido pensar numa utilização não desportiva para o local. Sentimentalismos à parte, a estrutura tem de facto pouco interesse do ponto de vista arquitectónico e mesmo uns azulejos decorativos que posssui podem ser salvaguardados num outro contexto. Pensemos pois que o local pode – e deve - ser utilizado para outra coisa.
Retomemos agora o tema de uma obra arquitectónica emblemática, que seja parte da linha de horizonte de Lisboa, e que possa ser a alternativa de imagem aos planos actuais para o Parque Mayer. Querem melhor local que o alto do Parque Eduardo VII? Bem dotado de acessos e com área e possibilidade de estacionamento, qualquer obra que ali se faça pode contribuir para dar nova dinâmica à cidade, em local de grande visibilidade e comodidade.
A questão das valências, que deve ser bem estudada, pode ter em conta a necessidade de uma estrutura que possa acolher música, conferências, reuniões; ou, em alternativa, que possa por exemplo alojar uma orquestra como a Metropolitana (que assim poderia deixar livre o local onde está, na Junqueira); ou, então, que possa ser o local de eleição para a instalação de um novo Museu, a grande sala de exposições da capital, onde alguma grande colecção possa encontrar o seu destino: já imaginaram ali um espaço como a Tate Modern? Em qualquer caso, a estrutura pode e deve prever equipamentos que permitam ser o ponto central de animação da Feira do Livro, em vez das estruturas provisórias que se vêm construindo há anos e que já consumiram, tudo incluído, cerca de dois milhões de euros, absolutamente a fundo perdido.
No fundo é uma questão de contas: como está, o Pavilhão não serve para nada. Para o remodelar, não faz sentido manter nem a estrutura, nem a finalidade desportiva face à oferta entretanto surgida e à que há-de desenvolver-se a nível de freguesias e clubes. Por isso é importante pensar no assunto agora, sem preconceitos e, sobretudo, de forma integrada: esta é uma peça da construção da cidade; temos que ver como se encaixa e relaciona com outras, para que cada uma fique com uma função diferente, complementar e útil.
BANDA SONORA - Ouvir um disco que não se conhecia a pensar em alguém é um bom exercício. O disco ideal para esta circunstância é «The Pyramid Sessions», por Rocky Marsiano, com o jazz e o hip-hop por base de trabalho deste português, que também usa o nome D-Mars. Deliciosamente provocador. CD Loop Records.
BACK TO BASICS – Não ter ideias feitas, aceitar mudar, ouvir os outros, pensar: provavelmente é o que faz mais falta a cada um de nós, em especial a todos os novos autarcas empossados ao longo desta semana.
PARA A SEMANA: O Cinema S. Jorge