February 18, 2008

UM OUTRO CANAL
Publicado na Revista «Atlântico» de Fevereiro de 2008

A história mais recente da evolução dos media mostra uma coisa muito interessante - coexistem duas tendências de certa forma antagónicas. Por um lado fortalecem-se os suportes generalistas mais agressivos, que se assumem como pólos globalizantes nos respectivos mercados, e, em simultâneo, começam-se a afirmar os veículos de informação e comunicação muito segmentados, dirigidos a públicos especiais.
Em Portugal continua a existir ainda medo pelo surgimento de novos suportes, pela proliferação de títulos. O reduzido crescimento do investimento publicitário nos últimos anos é argumento usado pelos suportes existentes para contrariar o inevitável alargamento do mercado. A questão, no entanto, não é essa. O verdadeiro problema, para os actuais grandes grupos de media, é como conseguirem manter a captação de investimento publicitário quando é certa a tendência para a procura de novos meios, novos suportes, que possibilitem uma afinidade e uma proximidade cada vez maior com os consumidores. E, quanto mais generalistas esse grupos procurarem ser, menos conseguirão captar os segmentos onde estarão os consumidores com maior poder de compra.
O rápido crescimento da internet – que dentro de alguns anos igualará a televisão na captação de publicidade nalguns mercados mais desenvolvidos, devia dar que pensar.
Na realidade é inevitável a convergência entre a televisão, tal como hoje a conhecemos, e a internet, num futuro que já não está assim tão distante.
Isto coloca aos operadores de televisão com maior experiência e capacidade um dilema: como conciliar a existência de canais generalistas fortes e com audiência massificada mas pouco qualificada, com a criação de novos canais, com outros conteúdos, eventualmente exportáveis para outras plataformas, que toquem os segmentos de publico que fogem dos canais tradicionais e que possibilitem captar investimentos publicitários que já não querem hoje em dia os canais generalistas de sinal aberto?
A resposta, no caso português, para já, pode estar no cabo. Tal como noutros mercados, será que aqui iremos assistir à criação de novos canais (ou à transformação dos existentes), por forma a captar o interesse dos consumidores com poder de compra, urbanos, profissionalmente activos? A SIC, que deu os primeiros passos na segmentação de canais há uns anos, tem hoje a esse nível uma oferta mal definida e provavelmente desajustada da realidade do mercado – e a existência de um novo canal de informação, da TVI, no final do ano, irá baralhar o jogo. E com uma SIC generalista agora tonificada, com Nuno Santos a disputar audiências com a TVI, fará ou não sentido alterar a definição dos canais de cabo existentes, criando um canal português assumidamente elitista, não exclusivamente noticioso, focado na realidade nacional mas cosmopolita, que seja veículo para os anunciantes que procuram outros públicos? Ou deixa-se esse mercado apenas para os canais internacionais de séries?



PENSAMENTOS OCIOSOS I
O Presidente francês Nicolas Sarkozy está a trabalhar no sentido de retirar completamente a publicidade dos canais de televisão do serviço público em França. O objectivo, relata a imprensa especializada, é promover uma programação de alta qualidade e, ao mesmo tempo, aumentar a produção local. A medida visa por um lado libertar o serviço público dos constrangimentos comerciais e, por outro, libertar uma fatia do mercado publicitário para fortalecer os operadores privados. Quererá Sócrates seguir o seu exemplo?
Recorda-se que em Portugal o Governo colecta uma percentagem do consumo da electricidade que se destina a pagar parte dos custos do serviço público de rádio e de televisão. Em França, Sarkozy, está a estudar o lançamento de uma taxa a pagar pelos operadores de telemóveis e Internet exactamente com o mesmo objectivo.
Até que ponto gosta Sócrates de Sarkozy?


PENSAMENTOS OCIOSOS II
Nos Estados Unidos a televisão de alta definição (TVHD) está muito mais implantada do que na Europa e isto deve-se, em primeiro lugar, ao facto de os norte-americanos terem optado pela distribuição das emissões de HD através do cabo, aproveitando a facilidade com que neste meio se obtém uma maior largura de banda. A mais recente cobertura do maior espectáculo desportivo do ano nos Estados Unidos, a Super Bowl, foi um festival: 47 câmaras simultâneas de alta definição mostraram todos os ângulos possíveis do jogo e da actuação, de meia hora, de Prince, que antecedeu a competição. Na Europa o território onde a TVHD está mais desenvolvida é na Grã Bretanha, em parte graças à rede de satélite da Sky – que usa muito a HD na Sky Sports.
Ora isto devia dar que pensar aos nossos queridos governantes: porquê reservar largura de banda na televisão digital terrestre para a alta definição se tudo indica que no futuro o seu melhor meio de distribuição está num dos sistemas de cabo ou de satélite? Claro que isto deixa outra questão em aberto – que fazer com as frequências que ficam libertas. Talvez mais canais…Dor de cabeça à vista, portanto.

Labels: , ,