UM REGIME PERIGOSO
(sobre o fim de «O INDEPENDENTE»)
O regime patrocina o apoliticismo, o amorfismo, o acriticismo, enaltece o cinzentismo, cuida religiosamente do dogma da infalibilidade de quem manda e promove os guardiões do templo. Aos poucos, nos últimos anos, foi-se reduzindo o leque de sensibilidades com presença relevante nos media portugueses.
O futuro analisará o peso que teve a concentração de media no universo da PT num panorama de efectiva diminuição de liberdade de escolha dos leitores e de consequente declínio da qualidade dos títulos.
Num universo de degradação da experiência e qualidade das redacções, a agência noticiosa volta a ganhar relevância – que não teve durante uma série de anos. Hoje a taxa de publicação ipsis-verbis dos despachos da agência é maior que nos anos 90 e isso é sinal do desinvestimento nas redacções e da degradação da qualidade do produto final. Não há-de ser por acaso que o Governo e seus apêndices estrategicamente colocados dedicaram particular atenção à nomeação de um director para a agência Lusa, que já se tornou conhecido entre os jornalistas por querer ler de fio a pavio, com especial atenção, todo o noticiário político antes de ele ser enviado para a linha.
Hoje em dia a imprensa portuguesa está qualitativamente pior que há uns anos, é menos informativa, mais opinativa, e inevitavelmente, perdeu capacidade de iniciativa e desprezou a proximidade aos públicos destinatários. A agenda dos jornais é ditada de fora – não pela actualidade, mas pelo trabalho de assessores de governos, de empresas, de instituições. Mais do que sugerir o que se deve ler, o trabalho de todos estes profissionais dedica-se a evitar que algumas coisas sejam ditas, escritas, abordadas. São os assessores do silêncio e na realidade são eles que mandam em muitos media portugueses. Querem encontrar uma razão para a semelhança e vacuidade da generalidade dos media? Comecem por analisar a coisa por este prisma.
O espectro geral do que se pode ler é mais reduzido, é mais fácil manipular a informação e a opinião do que há uns anos atrás. Há menos vozes contra, há menos media críticos, há menos jornalismo de investigação, há menos procura de histórias que acrescentem alguma coisa de novo.
Quando um regime sorri ao ver diminuir o leque de informação de que a sociedade dispõe as coisas não vão nada bem; e quando a sociedade fica impassível assistindo à redução da sua possibilidade de escolha, então o assunto é mesmo sério.
Nota – Quando «O Independente» nasceu em 1988 eu era seu subdirector. Ao longo destes 18 anos de vida estive quase sempre mais ou menos ligado ao jornal. O «Indy» nasceu como um projecto contra a passividade, que é o que hoje abunda na sociedade portuguesa. Tenho muita honra em me terem deixado sempre escrever nestas páginas.
Faz falta um jornal assim – que saiba dizer não. Que saiba dizer: Basta!
(sobre o fim de «O INDEPENDENTE»)
O regime patrocina o apoliticismo, o amorfismo, o acriticismo, enaltece o cinzentismo, cuida religiosamente do dogma da infalibilidade de quem manda e promove os guardiões do templo. Aos poucos, nos últimos anos, foi-se reduzindo o leque de sensibilidades com presença relevante nos media portugueses.
O futuro analisará o peso que teve a concentração de media no universo da PT num panorama de efectiva diminuição de liberdade de escolha dos leitores e de consequente declínio da qualidade dos títulos.
Num universo de degradação da experiência e qualidade das redacções, a agência noticiosa volta a ganhar relevância – que não teve durante uma série de anos. Hoje a taxa de publicação ipsis-verbis dos despachos da agência é maior que nos anos 90 e isso é sinal do desinvestimento nas redacções e da degradação da qualidade do produto final. Não há-de ser por acaso que o Governo e seus apêndices estrategicamente colocados dedicaram particular atenção à nomeação de um director para a agência Lusa, que já se tornou conhecido entre os jornalistas por querer ler de fio a pavio, com especial atenção, todo o noticiário político antes de ele ser enviado para a linha.
Hoje em dia a imprensa portuguesa está qualitativamente pior que há uns anos, é menos informativa, mais opinativa, e inevitavelmente, perdeu capacidade de iniciativa e desprezou a proximidade aos públicos destinatários. A agenda dos jornais é ditada de fora – não pela actualidade, mas pelo trabalho de assessores de governos, de empresas, de instituições. Mais do que sugerir o que se deve ler, o trabalho de todos estes profissionais dedica-se a evitar que algumas coisas sejam ditas, escritas, abordadas. São os assessores do silêncio e na realidade são eles que mandam em muitos media portugueses. Querem encontrar uma razão para a semelhança e vacuidade da generalidade dos media? Comecem por analisar a coisa por este prisma.
O espectro geral do que se pode ler é mais reduzido, é mais fácil manipular a informação e a opinião do que há uns anos atrás. Há menos vozes contra, há menos media críticos, há menos jornalismo de investigação, há menos procura de histórias que acrescentem alguma coisa de novo.
Quando um regime sorri ao ver diminuir o leque de informação de que a sociedade dispõe as coisas não vão nada bem; e quando a sociedade fica impassível assistindo à redução da sua possibilidade de escolha, então o assunto é mesmo sério.
Nota – Quando «O Independente» nasceu em 1988 eu era seu subdirector. Ao longo destes 18 anos de vida estive quase sempre mais ou menos ligado ao jornal. O «Indy» nasceu como um projecto contra a passividade, que é o que hoje abunda na sociedade portuguesa. Tenho muita honra em me terem deixado sempre escrever nestas páginas.
Faz falta um jornal assim – que saiba dizer não. Que saiba dizer: Basta!
<< Home