August 23, 2003

VENCER O DOGMA
Olho para o que escrevi nos últimos dias e são quase só citações. Em parte é normal porque sou um leitor compulsivo de revistas e de sites de revistas e, portanto, isso há-de reflectir-se de alguma forma. Mas por outro lado isso significa que deixei de contar o que se passa à minha volta, sem ser pela interposta pessoa da citação.
Na fase de arranque de projectos há sempre uma altura assim - que é a que me dá mais gozo- quando deixo de conseguir perceber o que se passa comigo. Existe um momento em que está tudo caótico, as coisas a fazer são notoriamente mais do que aquilo que o bom senso e o tempo que existe permitem. As equipas ainda não estão completas, as ideias continuam razoavelmente desarrumadas e o caos anuncia-se. Quando chego ao escritório de manhã e ligo o computador, abro um ficheiro de powerpoint que me habituei a utilizar como um lembrete permanente e que é uma espécie de lista de tarefas distribuídas por pessoas, entidades e áreas específicas de actuação. Vejo-o a crescer e a adicionar novas páginas ao longo da semana. É quase como entrar num quarto e virar do avesso um balde grande de lego cheio daquelas peças mais pequeninas: todos os dias de manhã é isso que acontece e lá me ponho a juntá-las até que fique montada alguma coisa com nexo.
Ontem mesmo percebi que para ter a trabalhar com a minha equipa uma pessoa que acredita no projecto, que os meus colaboradores querem, cuja saída é aceite pelo departamento onde está, cuja existência abstracta está prevista em todos os planos de organização, é preciso fazer um circuito burocrático que só existe para dar trabalho não produtivo a gigantescos departamentos administrativos, que tentam encravar, atrasar, dificultar, conservar o status quo, evitar a mudança - quanto mais não seja a fazer perder tempo e energias às equipas envolvidas em novos projectos.
Durante uns dias desta semana suspeitei que o balde de lego devia ter molas porque tinha uma tendência repetida para se virar e espalhar tudo de novo. Felizmente chego a este sábado com a sensação que ontem ficaram feitas algumas coisas, que as peças se começam a encaixar mesmo e que algumas ideias começam a concretizar-se. E, para mim, ver como algumas ideias que pareciam loucas se conseguem começar a realizar mesmo é a prova de que vale sempre a pena apostar nas ideias, sair dos limites de pensamento em que muitas vezes nos deixamos condicionar e acreditar que o velho dogma português «é assim porque sim, isso não se pode fazer porque não» foi mais uma vez vencido.