May 20, 2006

FAZER E PODER


O mais recente filme de Claude Chabrol chama-se «L’Ivresse Du Pouvoir» («A Embriaguez do Poder») e aborda a relação entre investigadores e investigados e os complexos jogos de poder que se estabelecem.

O caso é tão actual, pelos vistos, aqui como em França. Mas não afecta só o mundo da justiça, passa por todo o aparelho do Estado. Tomemos o exemplo de um Governo – não este em particular, mas um qualquer. Um membro do Governo tem sempre a ilusão de ser detentor de um poder (quase mágico) que efectivamente não tem. Muitas vezes deslumbra-se com esse poder e vive como se o tivesse. A pior forma de ilusão é quando o iludido se deixa convencer de que o poder que tem é suficiente para modificar as coisas e obter resultados, mesmo que apenas use lindas palavras e boas ideias e depois se esqueça de criar os mecanismos de acção que poderiam levar à sua concretização.

A versão mais recorrente da embriaguez do poder está na embriaguez da palavra. A promessa é o poder da política, o anúncio de medidas que não se concretizam é o abuso de poder.

A sociedade – em particular os media – não têm o salutar hábito de questionar e verificar o ratio entre promessas ou anúncios produzidos e medidas concretizadas. No subconsciente social é a evidente desproporção entre promessas e resultados que leva à degradação da imagem dos políticos. Nos dias que correm a demagogia não é só fazer promessas eleitorais impossíveis, é anunciar como de facto medidas e reformas que depois não são implementadas nem escrutinadas.

Tomemos o caso de Manuel Maria Carrilho, que se auto-proclama o melhor Ministro da Cultura de sempre. Acho que se alguém com seriedade fosse ver, de entre as coisas que prometeu, anunciou e falou, aquelas que efectivamente foram concretizadas teria uma grande surpresa. Carrilho poderá ser um homem de pensamento e palavra, mas não é um homem de acção, a não ser para a chicana política, como esta semana se viu. Ele não sabe fazer. Não sabe concretizar. Não é o único, mas é o mais evidente de todos. Façam o exercício e comparem o dito com o feito. O facto de uma boa parte do aparelho socialista ter ido ao beija mão a Carrilho é elucidativo. É gente para quem interessa pouco o que se faz. Gostam muito de falar, nem sempre de ouvir, raras vezes de fazer.