COMO SÂO FEITOS OS TELEJORNAIS?
Não resisto a transcrever:
31.II - Problemas genéricos da nossa Imprensa – A Agenda
Em Novembro de 2003, altura em que escrevo, a agenda é dominada a 70 por cento, por dois jornais: o CM e o 24 Horas; com o Público a ser (quase) o único a tentar ter uma agenda própria e quase todos os outros a serem a excepção à regra.
A rede de correspondentes destes dois diários e especialmente as denúncias, através de cartas ou telefonemas às redacções, são o Google que determinam os nossos noticiários. Como vivemos a tal tabloidização da informação em que uma facada é mais relevante de um ponto de vista noticioso público e nacional que, por exemplo, a dinâmica da Agência Portuguesa de Investimento, e como os media não têm tempo para entender que o seu negócio não é vender informação, mas sim cumprir o seu papel ainda num cenário de elevada competitividade (mais explicações desnecessárias, presumo), o CM e o 24 Horas impõem, involuntariamente, a sua linha editorial (natural e legítima) ao resto do país.
Se lessem diariamente estes dois jornais, escusavam de ver os noticiários das 20 horas das televisões. A dinâmica é esta: o editor do jornal televisivo vê a história de manhã num destes jornais, à hora do almoço o repórter já está em Sardinhais de Cima a filmar o nabo gigante e pelas 19h30 tem a coisa montada para entrar em alinhamento, talvez a seguir de uma casa podre, em que nunca é perguntado à desgraçada da inquilina quanto paga de renda, mas são sempre filmadas as rachas no tecto.
Não é novidade que os telejornais são magazines de variedades, largamente premiados pelas audiências e pelos anunciantes. O vouyerismo que há em cada um de nós, que levamos um dia inteiro de chatices, dificilmente encontra melhor companhia para o entrecosto e as batatas fritas que estas micro-narrativas de um mundo ainda mais irreal que o nosso.
À parte o novelo Casa Pia, quase não há ‘assunto’ e um país sem ‘assunto’ é um país estranho. Mas este país, que me lembre, nunca teve direito a ter um ‘assunto’, só ao ‘assunto’ dos jornalistas.
Até à revolução TVI – power to the people – a agenda era ditada em nome dos interesses dos egos dos editores e jornalistas que, por variadíssimas razões, brincavam ao jornalismo, e escrevo brincavam num sentido lúdico do termo e usavam o jornalismo para a sua própria pessoalidade e os seus interesses. (Ou por modismos: bater em Cavaco, bater no CCB, bater na Expo, bater em Vale e Azevedo, defender Timor, chorar Amália, gozar com Santana Lopes)
Assim, e como ilustração, se um editor fosse fanático por sumo, teríamos páginas e páginas sobre o assunto, independentemente do interesse noticioso ou sequer da receptividade do público que consumisse esse media. Ou seja, um jornal era uma coisa demasiado séria para ser deixada ao capricho dos leitores.
A frenética cobertura noticiosa das reuniões dos distritais dos partidos já vai esmorecendo, mas há cinco anos era vulgar ver laudas sobre várias, em vários sítios. A sua utilidade era marginal: o jornalista encarregue de cobrir o partido precisava de cultivar as fontes e sobredimensionava a importância dos jogos florais, porque até poderia vir a dar qualquer coisa...
Ainda hoje eu abro a boca de espanto quando alguém como L. F. Meneses (ou Ângelo Correia, ou João Cravinho, ou Miguel Portas, ou José Lello) ) aparece nos telejornais ou comenta na SIC Notícias. E falo como profissional: o que é que ele interessa, noticiosamente falando?
O resultado foi o esperado: as pessoas deixaram de comprar jornais e deixaram de ver telejornais. A solução, encontrada casualmente claro, foi tirar o tapete aos jornalistas que agora correm atrás do prejuízo, depois de perderem o controle da agenda.
Isto e muito mais pode ser lido aqui
Não resisto a transcrever:
31.II - Problemas genéricos da nossa Imprensa – A Agenda
Em Novembro de 2003, altura em que escrevo, a agenda é dominada a 70 por cento, por dois jornais: o CM e o 24 Horas; com o Público a ser (quase) o único a tentar ter uma agenda própria e quase todos os outros a serem a excepção à regra.
A rede de correspondentes destes dois diários e especialmente as denúncias, através de cartas ou telefonemas às redacções, são o Google que determinam os nossos noticiários. Como vivemos a tal tabloidização da informação em que uma facada é mais relevante de um ponto de vista noticioso público e nacional que, por exemplo, a dinâmica da Agência Portuguesa de Investimento, e como os media não têm tempo para entender que o seu negócio não é vender informação, mas sim cumprir o seu papel ainda num cenário de elevada competitividade (mais explicações desnecessárias, presumo), o CM e o 24 Horas impõem, involuntariamente, a sua linha editorial (natural e legítima) ao resto do país.
Se lessem diariamente estes dois jornais, escusavam de ver os noticiários das 20 horas das televisões. A dinâmica é esta: o editor do jornal televisivo vê a história de manhã num destes jornais, à hora do almoço o repórter já está em Sardinhais de Cima a filmar o nabo gigante e pelas 19h30 tem a coisa montada para entrar em alinhamento, talvez a seguir de uma casa podre, em que nunca é perguntado à desgraçada da inquilina quanto paga de renda, mas são sempre filmadas as rachas no tecto.
Não é novidade que os telejornais são magazines de variedades, largamente premiados pelas audiências e pelos anunciantes. O vouyerismo que há em cada um de nós, que levamos um dia inteiro de chatices, dificilmente encontra melhor companhia para o entrecosto e as batatas fritas que estas micro-narrativas de um mundo ainda mais irreal que o nosso.
À parte o novelo Casa Pia, quase não há ‘assunto’ e um país sem ‘assunto’ é um país estranho. Mas este país, que me lembre, nunca teve direito a ter um ‘assunto’, só ao ‘assunto’ dos jornalistas.
Até à revolução TVI – power to the people – a agenda era ditada em nome dos interesses dos egos dos editores e jornalistas que, por variadíssimas razões, brincavam ao jornalismo, e escrevo brincavam num sentido lúdico do termo e usavam o jornalismo para a sua própria pessoalidade e os seus interesses. (Ou por modismos: bater em Cavaco, bater no CCB, bater na Expo, bater em Vale e Azevedo, defender Timor, chorar Amália, gozar com Santana Lopes)
Assim, e como ilustração, se um editor fosse fanático por sumo, teríamos páginas e páginas sobre o assunto, independentemente do interesse noticioso ou sequer da receptividade do público que consumisse esse media. Ou seja, um jornal era uma coisa demasiado séria para ser deixada ao capricho dos leitores.
A frenética cobertura noticiosa das reuniões dos distritais dos partidos já vai esmorecendo, mas há cinco anos era vulgar ver laudas sobre várias, em vários sítios. A sua utilidade era marginal: o jornalista encarregue de cobrir o partido precisava de cultivar as fontes e sobredimensionava a importância dos jogos florais, porque até poderia vir a dar qualquer coisa...
Ainda hoje eu abro a boca de espanto quando alguém como L. F. Meneses (ou Ângelo Correia, ou João Cravinho, ou Miguel Portas, ou José Lello) ) aparece nos telejornais ou comenta na SIC Notícias. E falo como profissional: o que é que ele interessa, noticiosamente falando?
O resultado foi o esperado: as pessoas deixaram de comprar jornais e deixaram de ver telejornais. A solução, encontrada casualmente claro, foi tirar o tapete aos jornalistas que agora correm atrás do prejuízo, depois de perderem o controle da agenda.
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